sexta-feira, 28 de agosto de 2009

O Caso Brasileiro_4

Caso Brasileiro - Notas

[1] O relacionamento das organizações com a imprensa é uma das funções de relações públicas segundo definição oficial aprovada pela Associação Internacional de Relações Públicas em 1959 (Andrade, 1988, p. 71). Logo no capítulo II, da Lei no 5.377, de dezembro de 1967, que disciplina a profissão no Brasil, são consideradas atividades específicas de relações públicas “as que dizem respeito à informação de caráter institucional entre a entidade e o público, através dos meios de comunicação”. Apesar disso, sempre houve controvérsias sobre o responsável na empresa pelo relacionamento com a imprensa. Atualmente tramita no Congresso Nacional projeto de lei apoiado pela Federação Nacional dos Jornalistas, estabelecendo que Assessoria de Imprensa é atividade privativa de jornalista. Assim, Assessoria de Imprensa seria considerada como função desempenhada por jornalistas ao lado de atividades como redator, repórter, revisor e repórter-fotográfico, num adendo ao artigo 11 do Decreto no 83.284, de 13 de março de 1979, que regulamenta o exercício da profissão.

[2] Problemas éticos no jornalismo relacionados a isso eram comuns a partir, especialmente, do amadorismo que caracterizava o trabalho jornalístico. Repórteres não pagavam imposto de renda e tinham desconto de 50% nas passagens aéreas; o duplo emprego era comum, assim como o “jabaculê”, denominação dada ao presente oferecido por uma fonte ao jornalista. Assis Chateaubriand declarou em 1961, quando os jornalistas conquistaram o piso profissional: “Mas por que vocês fazem greve por piso? Eu estou dando para vocês emprego e espaço no jornal para escreverem. Porque vocês não ganham dinheiro com isso? Eu fiz minha fortuna assim” (Romeiro, 1987: 102). Considere-se, entretanto, que, naquele período, o jornalismo era em geral uma atividade complementar e os repórteres eram obrigados a ter outras fontes de renda para sobreviver. Segundo Medina (1982: 46), esta situação retardou a profissionalização da carreira.
[3] Consideramos como a melhor definição para assessoria de imprensa a apresentada por Chaparro (1989, p. 06): “a prática do jornalismo a nível de fonte, para assegurar aos meios de comunicação a qualidade da informação, sob o ponto de vista da técnica jornalística e da relevância social”.

[4] A visão que o jornalista em geral tinha do assessor de imprensa é dada por Noronha (1987, p. 94): “... um indivíduo que funcionava como uma barreira entre a fonte e os meios de Comunicação. Estava colocado com a intenção de esconder a notícia. (...) Se comportava muito mais como um relações públicas”.

[5] Quintão conta que, em 1983, 1.814 jornalistas foram enquadrados como técnicos em Comunicação Social do Serviço Público. “Outro tanto desses profissionais, contratados anteriormente em funções diferentes, não puderam ser absorvidos na mesma carreira, mas permaneceram funcionários do governo” (1993, p. 216).

[6] Os antecedentes são de 1978, quando foi feita uma tentativa de greve, mas contornada. Em 1979, a greve aconteceu, os patrões endureceram e houve estimadas 200 demissões. Para Abramo (1988:93), “a greve foi um suicídio” e desmoralizou a categoria.

[7] Um terço dos profissionais recebiam até seis salários mínimos, que era o piso previsto em lei para a profissão. O depoimento de Antonio Alberto Prado é elucidativo: “Nós, jornalistas, muitas vezes vemos nossa profissão como uma espécie de religião. Como para um padre, também para nós é muito difícil deixar a batina. No entanto, eu descobri que a enorme bagagem que os repórteres reúnem estava repleta de ferramentas fundamentais, desejadas, apreciadas e melhor pagas nas indústrias e em outras empresas não-jornalísticas” (O FUTURO..., 1993, p. 32).

[8] Em 1985 a Rhodia lançou seu Plano de Comunicação Social caracterizado como uma “Política de Portas Abertas”. Tratou-se de um avançado e pioneiro programa de comunicação empresarial. Bueno (1989, p. 5) informa que a política adotada pela Rhodia serviu de paradigma para as demais organizações. Ver mais sobre o assunto em Valente & Nori, Portas Abertas, Círculo do Livro, 1990, que traz um detalhado relato sobre o programa de abertura no diálogo entre a empresa e a sociedade no período entre 1982 e 1988. O livro é um clássico na literatura brasileira de comunicação organizacional por mostrar um tipo de posicionamento e exemplos de ações que acabaram tornando-se referências inevitáveis para a grande maioria das empresas brasileiras.

[9] Pesquisa realizada junto aos cursos de comunicação do Estado do Rio de Janeiro mostrou que, num universo que variou de 5% a 10% dos cerca de 11 mil alunos matriculados em cursos de Jornalismo, a área de comunicação empresarial e institucional é a segunda grande área de absorção dos profissionais (Lopes, 1997, p. 66).

[10] Os principais autores evitam o termo norte-americano house-organ pois, traduzido por “órgão da casa”, não representa a abrangência e a variedade das publicações empresariais (Torquato, 1987; Palma, 1994). Apesar de haver um certo consenso sobre esta inadequação, ainda é utilizado com freqüência.

[11] Na maior parte dos países, a atividade dos profissionais de relações públicas inclui o que no Brasil se convencionou chamar de assessoria de imprensa. Toda a prática de assessoria de imprensa ou produção de publicações empresariais faz parte do acervo teórico de relações públicas e é tratada nos livros desta atividade.

[12] Romeiro (1987, p. 103) diz que “o relações públicas é formado para promover as coisas. (...) Na hora em que é abordado por um jornalista, tende, instintivamente, a deixar o jornalista insatisfeito”. Simões (1995, p. 102) acredita que as relações públicas foram contaminadas por “um vírus pejorativo” e atribui parte da responsabilidade aos jornalistas. Em pesquisa realizada junto a 20 jornalistas em 1987, a maioria com cargos de chefia nas redações dos mais importantes diários do País, a Agência de Comunicação Social detetou que eles dão preferência aos contatos pessoais com os diretores de empresas, na presunção de que as assessorias de relações públicas não lhes contam toda a verdade (Release..., [19--]). Palma(1994, p. 74) diz que “muitas vezes (...) [o relações-públicas] é mesmo culpado pelas imputações que lhes são feitas”. Ele justifica afirmando que o relações públicas negligencia as regras básicas da notícia, bombardeia as redações com grande quantidade de relises de interesse unilateral, longos e redundantes. A crítica, entretanto, pode ser extensiva a muitos jornalistas assessores de imprensa.

[13] Uma maneira relevante de estudar a importância e atuação dos profissionais de assessoria de imprensa é pelo seu poder junto às redações: pesquisa realizada em Fortaleza, CE, em 2000, junto aos dois principais jornais do Estado, mostrou que, durante os cinco dias da coleta de dados, foi grande a influência das assessorias de imprensa no material editorial veiculado. No jornal O Povo, das 71 sugestões de pauta recebidas, 39 (54,9%) foram aproveitados de alguma forma naquela semana, totalizando 2,46 páginas inteiras. Das 64 sugestões de pauta que o jornal Diário do Nordeste recebeu, 31 (ou 48,43%) foram aproveitadas, significando 1,99 página de espaço editorial. O pesquisador nota que não foram examinadas sugestões de pauta e relises enviados naquela semana e aproveitados nas semanas seguintes, o que poderia ampliar o percentual. (Ribeiro, 2000).

[14] Existe uma relação de origem entre assessoria de imprensa e relações públicas: na primeira década deste século, o então jornalista norte-americano Ivy Lee deixou a imprensa para atuar na divulgação de empresários e orientá-los na conquista da opinião pública por meio da mídia. Também desenvolveu técnicas para influenciar as decisões jornalísticas. Em 1906 ele criou uma carta de princípios no seu relacionamento com a imprensa que passou a ser referência no assunto. Hoje é reconhecido como o primeiro assessor de imprensa da história e é considerado por muitos o "pai das relações públicas". Antes dele, a frase "the public be damned", atribuída ao empresário Henry Vanderbilt, sintetizava o padrão vigente no relacionamento dos grandes empresários com a imprensa.

[15] Entrevista a este autor.

[16] Marcondes Filho (1989, p. 31) mostra que os veículos de comunicação de massa, como instituições de natureza empresarial, utilizam a notícia como uma de suas mercadorias e não com o fim democratizante da informação: “mercadoria pura e simples, matéria solta e universal, como as demais mercadorias, fato social sem história e com reduzida ação no presente, reduzida inter-relação entre criador e receptor, reduzida proposta e colaboração para uma transformação individual e coletiva: alimento simbólico para a mente (...) O que se vende é a aparência do valor de uso”. Por outro lado, também afirma que só as empresas de comunicação têm “um falar genuinamente jornalístico. Todos os demais são veículos oficiais de transmissão de opiniões particularistas”, referindo-se a publicações empresariais e agências de notícias de sindicatos, igrejas e universidades”. (1993, p. 143).

[17] Ao assessor de imprensa cabe criar ou sugerir fatos ou eventos que possam ocupar espaço na mídia ou produzi-los especialmente para que sejam notícia. Esta atividade do jornalista já é institucionalizada.

[18] O artigo 13, por exemplo, diz que o jornalista deve “evitar a divulgação de fatos com interesse de favorecimento pessoal ou vantagens econômicas”, o que é a essência do trabalho do assessor de imprensa de empresas privadas. Enquanto o código de ética brasileiro proíbe o profissional de exercer cobertura jornalística pelo órgão que trabalha, em instituições onde seja funcionário, nos Estados Unidos o tema é bastante discutido, mas a opinião prevalecente é que o jornalista sequer pode se envolver com instituições - associações e partidos, inclusive - que possam influenciar, indevidamente, sua capacidade de noticiar imparcialmente. O código de ética da Associação de Editores Administrativos Associados de Imprensa para Jornais e seu Pessoal diz que “o emprego paralelo em fontes de notícia é óbvio conflito de interesses...” (Goodwin, 1993, p. 442), sem referir-se, como no brasileiro, que o jornalista cubra necessariamente esta fonte.

[19] Marinho mostra que os profissionais de uma determinada área tendem a exercer controle sobre seus pares, ao mesmo tempo em que praticam sanções monopolísticas contra eventuais intrusos. “São os interesses dos membros de uma profissão por poder, riqueza e prestígio que os leva a lutar pela conquista e manutenção de seu monopólio de competência” (1986, p. 108).
[20] Rossi, com base em dados fornecidos pelo Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de S. Paulo, estimava, embora a partir de dados que não considerava rigorosos, que em 1985 havia mais de 4.000 profissionais que não conseguiam atuar na área no Estado (1986, p. 39).
[21] Isto ocorre, de outra maneira, nos veículos de comunicação de massa. Os jornalistas que maior destaque obtêm não são necessariamente os de melhor texto, mas também aqueles que têm melhores fontes, cultivadas geralmente durante muito tempo e que por isso podem oferecer a seu público informações e análises exclusivas.

[22] Piva (1999, p. 82-83) traça o perfil necessário do jornalista em funções empresariais: estrategista político, articulador, consultor/conselheiro, capacidade de relacionamento, administrador de conflitos, capacidade para ler e interpretar o meio ambiente, dominar os meios clássicos de comunicação e descentralizador de operações.

[23] Enquanto o jornalista é preparado nas universidades basicamente para pensar a transmissão da informação à sociedade via veículos de comunicação de massa, o relações públicas estuda a lógica da comunicação com uma finalidade mais estratégica para a organização, ou conceitualmente, “promover, através do esforço deliberado, planificado e contínuo, a compreensão mútua entre instituição e os grupos e pessoas a que ela esteja diretamente ou indiretamente ligada”.

[24] Importante é distinguir entre “profissão”, regulamentada e exercida por pessoas oficialmente credenciadas, e a “atividade”, que é o exercício dos preceitos, no caso, da função de relações públicas. O preconceito e a recusa em aceitar que assessoria de imprensa é uma atividade típica de relações públicas parece até impedir que alguns jornalistas procurem a literatura da área, onde estão conhecimentos que o ajudariam a desempenhar melhor suas atividades em uma organização. O impasse resultante da ambigüidade ao exercer diferentes papéis profissionais mereceria maior discussão em nível universitário, em particular sobre a formação curricular de um jornalista que provavelmente não vai trabalhar em veículos de comunicação de massa.

[25] Um dos problemas que trouxe imagem negativa à profissão de relações públicas é sua relação original com práticas autoritárias de comunicação impostas pelo governo federal, primeiro com o DIP, no governo Getúlio Vargas, e, depois, com a Assessoria Especial de Relações Públicas. Criada por militares de linha dura em 1968, a AERP e as áreas de comunicação que a sucederam se caracterizaram pela autopromoção do regime militar e por dificultar o fluxo de comunicação entre governo e sociedade.

[26] Apesar de a atuação do jornalista em assessorias de imprensa estar institucionalizada e caracterizada como importante mercado, pesquisa realizada em 17 universidades do Estado do Rio de Janeiro mostrou que 66% não ofereciam disciplinas voltadas para a área de assessoria de imprensa (Lopes, 1997, p. 66). A assessoria de imprensa é, como vimos, a área de atuação mais rudimentar para o profissional de jornalismo em uma organização não-jornalística e, ainda assim, exige o domínio de uma série de técnicas particulares.

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