sexta-feira, 28 de agosto de 2009

O Caso Brasileiro_3


A NOVA ETAPA, A COMUNICAÇÃO ESTRATÉGICA

A assessoria de imprensa e a produção de publicações jornalísticas empresariais são atividades que podem ser incluídas no campo da comunicação organizacional, onde cada atividade tem seu papel específico e interage com as demais (relações públicas, publicidade e propaganda, editoração, comunicação mercadológica, etc.), no que Kunsch (1986, p. 107) chama de “composto de comunicação”. Nele, não há trabalho isolado de comunicação, mas uma integração natural de subsistemas que compõem a organização.

Torquato (1986, p. 68) diz que “a comunicação empresarial sistêmica dá unidade a um conceito de empresa, harmonizando interesses, evitando a fragmentação do sistema, promovendo, internamente, sinergia negocial e, externamente, comportamentos e atividades favoráveis à organização”. Torquato e Kunsch apontam a necessidade, nas empresas, de um sistema de comunicação reunindo atividades mercadológicas e institucionais. Neste modelo, é exigido um profissional com novo perfil, menos especializado e com visão global da empresa e seus objetivos. “Estamos entrando numa era em que o profissional de comunicação empresarial deixa de ser um mero executor de políticas para se transformar num elemento formulador de estratégias”, anunciava Torquato (Perfil..., 1994, p. 5).

“Hoje, dele requer-se muito mais do que apenas um bom trabalho de divulgação e coordenação de contatos com a imprensa ou comunidades” (Perfil..., 1994, p. 4). Esta era chegou em definitivo. A comunicação empresarial passa a ser percebida pelo empresário como instrumento fundamental, não apenas para viabilizar uma imagem favorável da empresa, mas como imprescindível para o sucesso da organização, inclusive no apoio aos objetivos mercadológicos, mesmo que de forma indireta. A partir deste momento, para administrar a comunicação, ignoram-se a formação e habilidades específicas de cada profissional, e busca-se alguém com “boas noções sobre marketing e administração, uma visão ampla da empresa em que trabalha, como ela funciona e, principalmente, saber como pode ajudar a empresa a realizar lucro” (Perfil..., 1994b, p. 7). E este é um mercado cada vez mais à disposição do profissional de jornalismo, mesmo que a maior parte do arcabouço teórico da atividade esteja relacionado a atividades como relações públicas, administração ou marketing. Na verdade, o jornalista passa a ocupar este espaço não ao assumir atividades típicas e limitadas à assessoria de imprensa, mas a partir do alargamento de sua visão de comunicação. [22]

Um exemplo desta mudança é apresentado pelo autor de uma das obras de referência brasileira sobre jornalismo institucional. Jaurês Rodrigues Palma, na primeira edição do livro Jornalismo Empresarial, de 1983, coloca o serviço de imprensa vinculado ao serviço de relações públicas, executando atividades bastante específicas: assessoria de imprensa e produção de publicações. Na segunda edição, de 1994, mostra como a situação se modificou e o jornalista passou a ampliar seu espaço de ação: “Se Comunicação Empresarial é macroárea, se Relações Públicas, Publicidade e Propaganda e Jornalismo são subsistemas, então fica estabelecido que o gerenciamento do supersistema, do processo global não é atribuição pré-definida de nenhum dos subsistemas e sim do profissional melhor habilitado” (Palma, 1994, p. 16).

O jornalista, em muitos casos, passa a coordenar toda a comunicação da empresa. Em termos de posicionamento profissional, deixa de executar assessoria de imprensa ou a produção de publicações empresariais, para pensar estrategicamente a comunicação. Isto, entretanto, não pode ser considerado ainda como comum, inclusive porque o background da profissão e a formação universitária não o levam nesta direção. O resultado é que a divulgação parece ser ainda a única face visível da comunicação para muitos dirigentes e jornalistas. Tende-se a imaginar que problemas de comunicação possam ser solucionados pela assessoria de imprensa, o que, embora possa ser um bom primeiro passo, dificilmente é suficiente. Para avaliar o assunto, basta examinar o arsenal de instrumentos de comunicação à disposição do profissional e a própria noção de “públicos” obtida na teoria de relações públicas.

Sem esta reflexão muitos profissionais não descobrem o potencial da ampliação de sua atividade profissional original, inclusive porque, em geral, falta a socialização dos colegas mais experientes, como nas redações, onde ao aprendiz recém-chegado são ensinadas, mesmo que por osmose, as políticas editoriais e o uso peculiar das técnicas pelo veículo. O resultado é que “muitos comunicadores têm responsabilidades estratégicas, mas preferem dedicar-se aos boletins informativos” (Corrado, 1994, p. 41). Ou seja, muitos jornalistas, por força de sua experiência limitada às redações ou formação universitária incompleta, tendem a entender as possibilidades da comunicação organizacional como mera produção de publicações empresariais e veiculação de matérias na imprensa.

O papel estratégico de administração dos processos de comunicação na organização parece surgir apenas pela visão ampliada do processo, em geral após uma lenta aprendizagem, baseada na experiência e interesse pessoal ou pelo nível de exigência imposto na organização. A dinâmica e as novas exigências do mercado estão tornando cada vez mais fluída a diferença entre a formação original de cada profissional. Limitar o campo de atuação pode ser um erro estratégico para os profissionais de qualquer área.

A capacidade de posicionar a atividade como “Comunicação Estratégica” e não em termos conceitualmente limitados como “organização de eventos”, “atendimento ao público”, “assessoria de imprensa” ou “jornalismo empresarial” é fundamental para quem quiser expandir seus horizontes profissionais. O nome do paradigma à disposição no mercado é “Comunicação” e as possibilidades que se abrem a partir do conceito imposto por esta terminologia ampliam notavelmente as oportunidades e exigências de atuação. Bueno (1995, p. 5) identifica a mudança no campo do jornalismo: “pelas novas demandas, o assessor de imprensa deixou de ser apenas um emissor de releases, despontando, hoje, como um produtor ou mesmo um executivo de informações e um intérprete do macroambiente”.

O novo profissional de Comunicação Empresarial deve ter capacidade de identificar e trabalhar com cenários do ambiente interno e externo, e ter domínio sistêmico sobre todas as áreas de comunicação. A assessoria de imprensa, por exemplo, continua importante, mas é apenas uma tarefa operacional básica e limitada. Apesar da penetração neste mercado e da ajuda que o jornalista pode prestar à empresa, o profissional que tem o melhor currículo universitário para administrar a comunicação da empresa é o profissional de Relações Públicas. [23]

Embora esta atividade continue extremamente relevante, [24] a denominação parece ter sofrido um desgaste tão grande, que apesar do esforço de muitos profissionais, ainda não foi possível superá-lo. Esta corrosão é tema recorrente nas discussões no âmbito da profissão e a tendência é relacioná-la principalmente a partir de seu uso pelo regime militar imposto ao país, [25] à vinculação ao lobby (na acepção mais negativa possível), à precoce regulamentação, problemas na formação universitária, e à tradição de corporativismo no uso do nome da profissão que impediu sua adoção por profissionais reconhecidamente competentes, mas sem a formação prevista na legislação.

Um dos resultados do desgaste da profissão é a perda de postos nas organizações, conseqüência da ocupação de suas atividades originais por profissionais com outras formações que chegam a adotar outras terminologias profissionais (gerente de comunicação é a mais comum) para desempenhar tarefas típicas de relações públicas. Outro sinal é a introdução de termos como endomarketing, marketing institucional, marketing social, marketing de relacionamento, mídia training, stakeholders, todos incorporando conceitos historicamente relacionados à prática de relações públicas, mas apresentados como “novidades” por profissionais de outras áreas, ganhando enorme visibilidade no mercado.

Na atuação em atividades de comunicação organizacional, seja pelo perfil pessoal, visão crítica inerente à profissão, pela maior proximidade com o poder, ou ainda por sua atuação em uma atividade mais visível e de maior interesse imediato para os dirigentes como é o relacionamento com a imprensa, muitos jornalistas ampliaram sua área de atuação e assumiram posições de destaque na estrutura de comunicação de organizações, coordenando áreas que podem levar nomes como comunicação social, comunicação corporativa, relações com a comunidade, etc. E, apesar da cada vez maior presença neste novo mercado, um profissional completo, que agregue à sua formação especialista uma visão mais generalista, está por se tornar comum. “Ainda não temos no mercado profissionais de qualidade que entendam a comunicação organizacional no sentido sistêmico. Temos, na realidade, profissionais de RP com visão muito limitada, jornalistas bons de texto mas com visão também limitada...” (Torquato, 1995, p. 16).

Para o jornalista, um novo campo de trabalho, na área de gerenciamento dos processos de comunicação está sendo oferecido pelas organizações de todo tipo: ONGs, entidades de classe, associações, empresas, escolas, órgãos públicos. Mas, ao mesmo tempo, as exigências são maiores. Haverá, sempre, espaço para atividades técnicas como produção de releases, de jornais empresariais, edição de conteúdo em sítios na internet.

Se, entretanto, optar por tornar-se estrategista, administrador dos fluxos de comunicação ou buscar converter a comunicação em uma ferramenta à serviço dos objetivos organizacionais, as oportunidades são infinitamente maiores. “Os repórteres, redatores, diagramadores e coordenadores de eventos continuam sendo imprescindíveis [...] mas certamente a cabeça do negócio da comunicação estará, cada vez mais, no profissional que concilia competência técnica com uma visão gerencial moderna e que sabe vislumbrar, com lucidez, a íntima relação entre comunicação e negócios.

A esse profissional está reservado o comando. Pensando bem, ele merece o cargo” (Bueno, 1995, p. 25). No novo modelo de comunicação que se consolida, passam a existir três tipos de profissionais de jornalismo. Há o tradicional, nas redações. E há também dois novos campos, criados no caso particular brasileiro. Aqueles que realizam trabalho de execução como o que faz assessoria de imprensa, produz conteúdo na internet ou elabora a publicação da empresa [26].

E há também aquele, de formação original em Jornalismo, diretamente ligado à alta administração das organizações, e que ajuda a definir seus rumos, utilizando a comunicação como insumo na tomada de decisões. E parece ser este que, no futuro, irá ser o grande estrategista de comunicação na maior parte das organizações. Depois de vencer o tabu de seus próprios pares, o jornalista agora enfrenta o desafio de prover soluções em Comunicação Organizacional.

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